26.5.08

Não consigo.

imagem: google Isto tem andado animado. Vou partilhar convosco uma das razões para tanta animação. Acho, sinceramente, que estou a atravessar uma espécie de fase de desencanto com algumas coisas. Por circunstâncias da vida, não sei bem quais, mas aconteceu recentemente estar numa situação em que pude testemunhar, de perto, a tomada de decisão talvez mais antiga do mundo: o que é verdade e o que é mentira? Verdade ou mentira? Que verdade? Que mentira? Há sempre vários tipos. Claro que há. Há ainda mais formas de ver uma mesma questão. Normalmente, vemo-la da forma que mais nos convém. Claro. Eu pude testemunhar a decisão nada fácil de uma pessoa bastante chegada que foi confrontada com a seguinte opção: continuar a viver sob uma pretensa/suspeitada mentira (ou não verdade) ou descobrir a verdade pura e absoluta. Não interessa o assunto em questão. Permanece a decisão. Eu, resoluta e firme na minha convicção de que vale toda e qualquer verdade sobre toda e qualquer mentira, talvez por ser insegura ao ponto de conseguir lidar melhor com uma verdade (que seja minha, claro, e não necessariamente para os outros ou para quem ma conta), por muito dura que seja, do que com a possibilidade de mentira. Detesto viver na dúvida em relação ao que for. Faz-me mal. Dá-me comichões. Consome-me. Enche-me de mal-estar e mágoa. Verdade acima de tudo. Mantenho-me firme nesta convicção. Saber a verdade é um mecanismo de defesa, se quiserem. Mas, como é óbvio, nem todas as pessoas pensam desta forma. Ou porque não precisam da verdade para continuar a viver, ou porque já tomaram as suspeitadas mentiras como sendo as suas verdades. Algo é verdade porque passamos a acreditar nela? Ou permanece mentira na mesma? Se for essa a nossa verdade e se for com base nessa informação que tomamos decisões e respiramos o ar que nos rodeia? É a nossa verdade? É. Mas, não penso que seja por nós acreditarmos numa coisa que ela passa a ser verdade naquela escala universal que diz se as coisas são verdade ou mentira. Se são reais ou inventadas. Isso são valores absolutos. Nada os muda. Nós podemos é não ter toda a informação de que precisamos para termos total conhecimento do que é verdade e do que é mentira. E se tivéssemos? Se tivéssemos a possibilidade de agir sobre uma suspeita de não-verdade ou mentira? Virávamos o nosso mundo de pernas para o ar em busca dessa verdade? Ou pesaríamos os prós e contras dessa descoberta? A verdade vale pela verdade ou vale mais se não trouxer dor e mágoa? Se tomar conhecimento dela não alterar o que já era? Pensar nas consequências de uma mentira faz-nos perder a vontade de a descobrir? Pensar nas consequências de uma verdade faz-nos perder a vontade de a descobrir? Tenho uma amiga minha que diz que as pessoas, no geral, gostam de viver enganadas. Gostam de viver sob alçada de uma mentira piedosa ou sob o chapéu de uma verdade não completa do que ter a totalidade de uma ou outra nas mãos. Ela diz que saber isto sobre o ser humano é meio caminho andado para o sucesso, para uma vida descansada em que sabemos, à partida, que as pessoas só vão crer naquilo que querem, que não vão fazer grandes esforços para descobrir nem uma nem outra. Que o meio termo é o ideal. Nem verdade nem mentira. Infelizmente, tenho de concordar com ela. Vejo isso todos os dias. Vejo isso com pessoas que me são chegadas e que preferem passar o tempo a debater as razões de busca de uma verdade ou mentira em que vez de se preocuparem que o simples facto de já estarem a debater isso é porque algo não está bem. Todos os dias assisto a pessoas que tomam decisões com base em informação seleccionada de antemão para melhor justificar aquilo que queriam e desejavam fazer desde o início. Já sabiam o fim que queriam; arranjaram os meios. Todos os dias vejo olhares incompletos, olhares vazios que se fecham perante a ameaça de algum pedaço de informação que possa obrigá-las a abri-los de vez. Pessoas que, cheias de medo, fazem tudo para evitar o sofrimento que a confirmação desse medo traz. Não sei se estou a ser boa amiga ou pessoa sequer quando digo que, para a busca e descoberta da verdade, incluindo as suas consequências, estarei presente a cada passo do caminho, mas que se for para continuar na busca de argumentos que possam, de alguma forma, minimizar ou fazer desaparecer as suspeitas de mentira, eu não vou estar. Não consigo, enquanto pessoa e muito menos enquanto amiga, alimentar a continuação de uma possível mentira arranjando formas de a negar. Quase como se todos os dias se tivesse de arranjar um pedacinho de qualquer coisa que poderá aniquilar aquele outro pedacinho de possível mentira. Como se fosse um puzzle a ser construído contra um quadro de suspeitas devidamente organizadas e arranjadinhas até estarem todas tapadas e esquecidas. Não consigo. É mais forte que eu. Simplesmente não consigo.

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