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No espaço de uma semana, recebi duas ordens de marcha da
vida de duas pessoas que eram (e são) muito importantes para mim.
Um mandou-me à fava (quis dizer “merda” mas estava gente
presente e a coisa podia soar mal) e outro esticou-me o dedo do meio e
proferiu, em tom menos simpático, “monta-te aqui e dá aos pedais”.
Ora, eu, que sou sempre muito bem-mandada quando me
convém, fiz-lhes a vontade (não literalmente, claro, ainda que ir de bicicleta
buscar merda ou favas dê mais jeito do que ir a pé, especialmente se a
bicicleta tiver cesto e buzina para afastar gente incauta do caminho de tal
carga fedorenta) e fui. Longe de mim permanecer perto de quem tão veemente não
me quer por lá. Gosto demasiado das duas pessoas para não lhes fazer a vontade...
E então, enquanto pensava na relevância de ambas as
frases que me foram ditas, e tendo chegado à conclusão que ambas querem dizer
exactamente o mesmo ainda que uma revele um pouco mais de maturidade e bom
senso, pus-me a pensar para trás para ver o que era que eu tinha feito para
merecer tais ordens de marcha tão requintadas.
Desenganem-se se acham que vou afirmar que nada fiz e que
tudo aquilo não terá sido merecido. Fiz e foi. E mais! Até vos digo!
Em ambos os casos, os intervenientes fizeram algo menos
correcto em termos de tratamento aqui da minha pessoa. Eu, filha de boa gente,
senti-me e mostrei o que senti. Mas devo de o ter feito de forma demasiado boa
porque, sem argumentos que pudessem reverter tanto o que foi feito, como o que
mostrei ter sentido, as saídas optadas para ambas as situações foram as mesmas:
eu que me fosse embora, que desaparecesse da vista, que me pirasse dali.
Compreendo perfeitamente.
Eu, das vezes em que fiz merda a alguém, também não
queria ter essa pessoa por perto. Lembrar-me do que tinha feito, vendo ali o
resultado estampado num olhar magoado ou em palavras ressentidas? Caredo! Qual
quê! E o peso na consciência que isso faz sentir? E o mal que nos faz sentir o
estômago dar voltas de frustração por não conseguirmos que a pessoa nos perdoe
ao mínimo eco da palavra “desculpa”? E a vontade que é pegar na pessoa pelos
colarinhos para que acredite no nosso pedido de desculpas? E a dor que é ver
que essa pessoa não começa logo a sorrir de seguida, esquecendo rapidamente o
que terá acontecido e permitindo que a vidinha continuasse sem mais nem menos? E
quando não se entende que a pessoa precisa de tempo para assimilar e recuperar
fôlego (mesmo tendo aceite as desculpas que às vezes são mesmo só isso…
desculpas) e partimos logo para a violência e ficamos zangados com essa pessoa,
e viramos as coisas ao contrário e ainda temos o desplante de proclamar que até
tínhamos pedido desculpa e tentado meter tudo ok mas que se a outra pessoa não
aceita e não volta à vida normal no imediato, então que se foda, que vá á fava,
que se monte no caralho e dê aos pedais?! Been there, done that, got the
t-shirt. Sei como funciona.
Eu compreendo. Eu percebo. Eu sei o que fiz para ter
recebido em troca o que recebi.
Mostrei-me magoada e zangada com o que duas pessoas me
tinham feito, sem ter tido em consideração que há gente tão frágil, insegura e
cobarde que não se pode dizer nada de nada – mesmo sendo nós os ofendidos – não
vá a coisa piorar toda a situação só porque tivemos a audácia de nos magoarmos
e nos zangarmos e, ainda por cima, mostrá-lo!
Curioso ambas as situações se terem passado com homens.
Curiosa esta minha capacidade de os fazer sentir assim,
tão pequenos e indefesos que nem por perto me querem, mas tão fortes e espertos
que se acham no direito de fazer merda enquanto lá estou. E sim, admito, este é
problema meu, não deles. Devia ser menos eu. Talvez assim lhes resolvesse uma data de questões.
Agora, e tendo por base o meu espírito apaziguador e tendência
a cumprir com a vontade dos outros, um vai ter que vir à merda visitar-me se
por acaso me quiser ver os dentes mais alguma vez e o outro vai ter que se
montar no caralho e dar muito bem aos pedais se quiser saber como me tem
corrido a viagem.
E ainda dizem que tenho mau feitio. Foda-se. Eu até faço
as vontades à malta. Cambada de ingratos. Ehhh.