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Num destes dias, e não tendo eu nada melhor para fazer, tentei fazer uma espécie de conta que me conseguisse indicar, com alguma certeza ou com relativa incerteza, quantas pessoas conheço que não tenham sido afectadas pelo bicho mau da infidelidade, fosse lá qual fosse a forma na qual o mesmo tenha decidido manifestar-se na vida de cada um.
Se nada tinha para fazer antes, com pouco ou nada fiquei para fazer depois.
A conta deu resultado bonitinho e redondinho: Zero. Uma ou duas, vá… Nunca se sabe.
O meu cérebro começou a rever as histórias que conheço de gente que conheço e desconheço e, sob uma crescente nuvem de desilusão e incredulidade, lá cheguei àquele brilhante resultado.
E o que mais me assombrou foi ter começado a compartimentar as tais “traições” e ter chegado à conclusão que existem níveis hierárquicos quanto à gravidade dos cornos que se metem e se levam. Uns brilham mais que os outros. Uns são mais pesados que outros. Uns mais bonitos, outros mais feios. Uns são uma bênção; outros, um castigo. Uns, um alívio; outros, uma vingança. Uns, uma distracção; outros, um objectivo. Uns perdoam-se; outros esquecem-se. Uns destroem vidas; outros permitem que sejam reconstruídas. Consegui discernir uma data de critérios de classificação que, no fim, fazem com que cada caso seja um caso mas também com que andemos todos devidamente enfeitados ou prontos a enfeitar o próximo (sim, porque uma vez cornudo, para sempre cornudo. Mesmo que se termine a relação, permanece o peso do acto cometido mesmo que com o tempo se torne mais leve e menos sentido… ou ressentido…).
Nas histórias pessoais que conheço, há quem ande a tentar viver com o peso dos acessórios, equilibrando-se a cada passo como se fossem Misses a tentar balançar livros em cima da cabeça para aprenderem a andar de forma mais elegante. De vez em quando lá vão levando a mão à cabeça para os colocarem no sítio certo, para terem a certeza que ainda lá estão, ajeitando-os de modo a não provocarem ainda mais desequilíbrio nos tais passos dados a tanto custo. Há quem ainda não os tenha sentido em toda a sua glória sendo que de vez em quando apenas sentem um ligeiro comichão no alto da pinha que os deixa desconfortáveis mas que atribuem quase sempre a ataques de caspa aguda. Há quem nem sonhe que tal coisa seja possível acontecer no seu mundo belo e amarelo como se cabeçorra tivesse sido equipada com pára-cornos à nascença. E depois há os que, ao sentir estranho peso sobre a testa e ao repararem que tais apetrechos bloqueiam a vista, os tentam devolver espetando valente marrada em quem ofereceu o que nunca tinha sido pedido, eliminando desde logo possibilidade de segunda volta à praça para ainda mais aplausos do público. Também há quem aceite tais enfeites e os vá tentando limar, em conjunto com quem os doou, até quase desaparecerem e deixarem de se fazer sentir.
É triste olhar à minha volta e ver pessoas de quem gosto a sofrer por terem a mesma falta de coragem que quem lhes traiu teve quando o fez, vivendo a situação como se fosse algo que a vida traz e não aceita de volta, ou então, e talvez pior, ver quem passa os dias de forma alegre e contente, sem nunca sonhar que de cada vez que abana a cabeça há malta que inconscientemente se desvia do caminho não vá alguma coisa vazar-lhes uma vista.
Isto tornou-se numa espécie de epidemia na qual se padece da doença voluntariamente. Vale tudo nesta guerra, até mesmo tirar olhos. Qualquer meio justifica o fim, qualquer mentira justifica continuar-se com a vida como se nada fosse, qualquer engano vale mais que o mais pequeno laivo de honestidade e sinceridade.
Basicamente, cada um vive com os cornos que tem ou põe da melhor forma que pode e consegue. Mas é triste que assim seja. Muito.
Não há fé no Amor que resista. Não há Amor que resista. Não há nada que resista àquele tipo de comportamento que nega o outro, que o mete ao mesmo nível de mosca que se esmaga contra uma parede porque nos incomoda o almoço.
Cornos para isto. Pronto.