imagem: google
Certa vez, há muitos anos, um homem muito sábio e conhecedor do mundo que tenho o enorme prazer de conhecer e com o qual privo, disse uma coisa que, sinto, me ficou queimada a ferro e fogo no cérebro.
Ele, guru da gestão, em Portugal para uma conferência, fez um exercício de grupo com todos os presentes. O exercício era simples: pedir a todos que analisassem e avaliassem o posicionamento que consideravam que as suas empresas tinham nos mercados em que operavam. O questionário desenvolvido permitia também captar a margem de erro da coisa tendo por base informações reais desses mercados e de outros concorrentes sendo que, no final, era possível contrariar, de forma directa, as opiniões individuais dos respondentes.
Isto pode parecer ser tudo muito simples e básico mas, na realidade, não o é. Vejam o problema que pode ser as opiniões não serem coincidentes. Vejam o problema que pode ser uma empresa ter uma ideia de si própria enquanto que o mercado e respectivos “players” possuem outra completamente diferente. Reparem na distorção que isto pode provocar, nos erros que pode originar e, mais perigosamente, nas absolutas calamidades que podem nascer quando uns acham que a coisa é azul e outros a tratam como se fosse vermelha…
Passado o choque inicial quando os resultados do exercício foram revelados, o tal Senhor proferiu o seguinte de forma tão calma que até assustou: Não interessa se a forma como nos vemos é certa ou errada por comparação aos outros porque nós vamos sempre agir e fazer as coisas de acordo com a nossa percepção, a nossa realidade, mesmo que isso signifique dar tiros nos pés todos os dias. Os ajustes das percepções internas e externas têm de colmatar numa visão comum de uma mesma coisa, mas é, primeiro, percebendo a realidade em que pensamos nos mover que se tem de iniciar qualquer acção de melhoria. Perceber a forma como nos vimos e depois, se estivermos errados, ajustá-la. Se estivermos certos, há que ajustar a forma como nos vêem a nós. Não pode é haver vários nomes para uma mesma coisa.
E não pode.
Cada um de nós tem a sua realidade (seja ela mais ou menos fantasiada ou alicerçada em fundamentos fidedignos e concretos ou não) e é de acordo com essa realidade que agimos, fazemos o que fazemos, dizemos o que dizemos e, no essencial, somos o que somos. É com base na nossa realidade que analisamos e avaliamos as realidades dos outros, mesmo sabendo que não possuímos todos os elementos necessários para o bem fazer – temos é de ter análise e avaliação prontas de modo a que a nossa própria realidade seja o mais suave e compreensível (para nós próprios) possível.
É justo dizer que ninguém se está para dar ao trabalho de perguntar “mas porquê?” de todas as vezes que a colocação dessa simples pergunta evitaria muita causticidade. É também justo dizer que, na maior parte das vezes, ninguém faz essa pergunta porque a explicação dada poderia requerer todo um novo leque de porquês, terminando os mesmos apenas e só quando se tivesse exactamente a mesma informação (realidade) que o outro de modo a que a tal análise e avaliação fosse o mais justa e fiel possível. Dá trabalho conhecer. Saber ocupa, de facto, lugar. Dá trabalho sermos confrontados com o que não sabemos e não entendemos. Dá trabalho fazermos ideia do que não fazemos ideia. Por isso, e tal como quem se mete num atalho, preferimos o caminho mais curto do “ir pela pinta” da coisa e siga para bingo que se faz tarde e a malta tem que se ir deitar.
Sempre gostei de entender as coisas. Sempre tive uma curiosidade quase mórbida em saber como as coisas funcionam, de as ver trabalhar, mexer. Adoro máquinas com protecções transparentes, por exemplo, podendo ficar horas a ver e a tentar perceber como é que um certo mecanismo funciona em conjunto com outros, como se inicia e termina o processo, como do nada se produz algo. E não é só com máquinas e afins que tenho esta curiosidade. Ainda que a um grau muito menos propenso ao menor erro possível, também possuo esta curiosidade para com as pessoas. Gosto de lhes saber os porquês. Gosto. E procuro sabê-los por todos os meios que me sejam possíveis (nem sempre um porquê calha bem no meio de uma conversa…).
Esta minha curiosidade também se aplica a mim. Gosto de me saber os porquês. Não me desculpo de nada. Não alego desconhecimento de causa de mim própria para o que faço ou sou. Sou-me e sei-me de acordo com todas as respostas a infindáveis porquês que me vou colocando ao longo do tempo.
Esta minha curiosidade também se aplica a mim. Gosto de me saber os porquês. Não me desculpo de nada. Não alego desconhecimento de causa de mim própria para o que faço ou sou. Sou-me e sei-me de acordo com todas as respostas a infindáveis porquês que me vou colocando ao longo do tempo.
De vez em quando, mesmo assim, levo com belas doses de actualização de realidade e percebo, como se fosse novidade ou como quem leva um murro bem aviado no estômago, que sou extremamente, totalmente, doentiamente, implacavelmente intolerante e inflexível para com as intolerâncias e inflexibilidades dos outros. Não admito que não me admitam seja o que for. Não admito. Não admito que não me coloquem um porquê e que passem logo para os porques. Não aceito e sou contra quem não aceita e é contra. E sei porquê. Mas não digo. Que me perguntem. Que façam comigo o mesmo esforço que faço com os outros, que tenham a mesma boa fé (ou pura ingenuidade de espírito) comigo que eu tenho com os outros.
E, no meio disto tudo, e ainda que possa ser doloroso saber os nossos porquês, muito mais doloroso é ir descobrindo os porquês dos outros de cada vez que falham em fazer essa tão pequena e simples pergunta a quem mais devem.
Mas lá está, e assim dizia o outro senhor que me forjou isto tudo no cérebro – cada um tem a sua realidade, agindo sempre de acordo com a mesma.
Eu, na minha intolerância para com a intolerância, manifesto-me intolerante para com os intolerantes, até para comigo, e lá vou perguntando cada vez mais porquês a quem de direito, eu incluída, nem que seja para um dia poder sentir que é impossível (ou lá perto) podermos ter dos outros uma realidade tão afastada da que pensam para eles próprios. E tudo isto seria muito mais fácil de deixar pousar no estômago não fosse a máxima do “tudo é possível” de vez em quando fazer-se ouvir tipo sirene de alerta de iminente catástrofe. Antes de a calar, vou só dar uma olhadela a como funciona. Gosto de saber como as coisas funcionam.
E, no meio disto tudo, e ainda que possa ser doloroso saber os nossos porquês, muito mais doloroso é ir descobrindo os porquês dos outros de cada vez que falham em fazer essa tão pequena e simples pergunta a quem mais devem.
Mas lá está, e assim dizia o outro senhor que me forjou isto tudo no cérebro – cada um tem a sua realidade, agindo sempre de acordo com a mesma.
Eu, na minha intolerância para com a intolerância, manifesto-me intolerante para com os intolerantes, até para comigo, e lá vou perguntando cada vez mais porquês a quem de direito, eu incluída, nem que seja para um dia poder sentir que é impossível (ou lá perto) podermos ter dos outros uma realidade tão afastada da que pensam para eles próprios. E tudo isto seria muito mais fácil de deixar pousar no estômago não fosse a máxima do “tudo é possível” de vez em quando fazer-se ouvir tipo sirene de alerta de iminente catástrofe. Antes de a calar, vou só dar uma olhadela a como funciona. Gosto de saber como as coisas funcionam.